quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O homem errado

Você se (es)vai
Com suas mulheres
Vazias

Ela se distrai
Em suas noites tão
Frias

Você não pensa
Nem ama
Nos finos tratos
Da cama

No duro estrado
Da cama
Ela só pensa
Que ama,

Sem dor,
Sem memória,
Você só sabe
De uma história
Caminha torto
E apressado
Cuspiu no nome
de bem-amado

Não
liga.
Não
chama.
Não
diz que
te ama.
Não
sente.

Mente.
Só vem
De repente.

Ela só ri,
Ela é só rio,
Um riso amargo,
Um calafrio
Um falso amor
Que está condenado,
O da mulher certa
E o homem errado.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Enquanto esperava,

ela tomava café, sentada na escada da faculdade, olhando o vaivém de gente conhecida, de gente que nunca vira na vida. Os olhos fixos num ponto morto - uns chamam de "olhar para o vazio"; mas seus olhos fitavam uma espécie de infinito.


Já fazia mais de uma hora naquele dia, e já fazia quatro dias que, todas as tardes, ela pegava um café, botava os fones de ouvido e abandonava o corpo e o pensamento naquelas escadarias, naquele mesmo ponto. Gostava de ver a vida passar enquanto esperava. E esperava.

As pessoas comentavam entre si com olhos de piedade e curiosidade, mas ninguém ousava aproximar-se dela e perguntar a quem, ou o quê, esperava. Por que ali, nas escadas? Por que não no café do prédio, sentada numa mesa, como gente normal?

A verdade é que, para ela, tanto fazia o que os outros achassem ou deixassem de achar - só ela sabia o que se passava por aquela cabeça e por aqueles fones de ouvido. Checou o relógio pela décima vez; nada ainda. De novo. Mais um dia. E se ele não viesse? Cinco da tarde, a aula já tinha acabado - mais um dia sem a resposta, o presente, o sonho.

Esperou mais meia hora. E, passada a meia hora, mais quinze minutos. E, por fim, uma adicional tolerância de cinco minutos. O golpe de misericórdia: mais três minutos; prorrogação de um jogo mais feio e sofrido que o da Alemanha. E ela não sabia o que fazer para explicar a si mesma, a Deus, ao raio que a partisse, que, não, ele não viria de novo. Ele não passaria por ali - mudou a rota, se perdeu, sei lá. Mas não adiantava nem chorar, e nem ouvir Radiohead no último volume.

E L E  N Ã O  V E M .

Suspirou fundo, derramou uma grossa lágrima, apanhou suas coisas e saiu, jurando que mataria o primeiro que ousasse tocar no assunto. Ele não vem; pois finados amores não voltam ao mundo dos vivos. Não era ela; sempre havia sido ele. Um amor torto, ruim das pernas, mas não deixava de ser amor. A última palavra da última briga. Nunca mais. Será que tem essa de amor que não dá certo? Ou será que, se não deu certo, é porque não era amor? Ela já se desdisse e se contradisse umas trezentas vezes desde que começou a analisar as perdas e danos do que ficou - ou melhor, passou. E passou? Mas ainda doía.

Foi para casa, mas resolveu que, assim, já não dava para ficar. Não sem ele, que pra tudo se dá jeito; mas ela já não podia se entregar ao fardo de uma dolorosa espera. Velando o morto, seu corpo. Esperando que as feridas se curem. Esperando que ele voltasse. Esperando tudo voltar a ser como sempre foi. Esperando o momento em que se menos espera: o de encontrar a Felicidade, que teima em fugir do Amor. Esperando as perguntas virarem respostas, os is serem pingados e os corações repartidos, ao serem colados os cacos.

Ela estava em frangalhos; mas coração não sabe escolher. Ela tinha que lutar contra o próprio coração e, mesmo em carne viva, escolheu seguir em frente sem olhar para trás. Ajoelhou, chorou, engatinhou, levantou-se, caminhou, até correr. Voar. O mundo voa mais rápido ainda, e o pai Tempo encarregou-se do bálsamo, com toda a sua sabedoria e sagacidade.

Amar é verbo defectivo que não se conjuga no pretérito: não se diz "amou" nem "amei", posto que não morre. Adormece, amortece, aquieta-se como um vulcão adormecido; mas, se morreu, não era amor. Porque Amor e Morte são implacáveis, certeiros, irreversíveis.

Ela ainda não entendia; não sabia conjugar seus verbos, nem contar seus dias - oitocentos e oitenta e cinco felizes, quatro de luto - mas, enquanto não aprendia, resolveu viver. E sobreviveu. Ninguém morre de amor. Mas, por ele, aconteça o que for, podemos sempre escolher viver.

sábado, 11 de outubro de 2014

Eureca!

 
O quarto tá uma bagunça. O coração, então, nem se fala. Já não me preocupo com o que é clichê ou não é, porque, no fim das contas, todo mundo passa por isso de vez em quando: é a crise dos dezessete anos vindo à tona muitos anos depois. Pois, muitos anos depois, ainda somos os mesmos jovens solitários do coração partido: perdidos, confusos e cheios de sonhos. O que será de nós, ó, mundo cruel?

Eu já não ando a passo lento - a cidade grande nos obriga a sobreviver a passos largos e rápidos; quem chegar por último é a mulher do padre. Até nisso precisamos ser os primeiros: a fila do metrô, o almoço com a amiga... meia hora de atraso. Por mais que eu corra, estou sempre atrasada. A culpa é do trem; essa linha 7 não funciona direito aos finais de semana. Eu perco tempo - e me perco. Mais de uma vez. Uma, duas, três semanas passaram voando e de raspão - mas aquela noite de serão mais pareceu uma eternidade. Meu ser incauto é violentado pela dúvida: será este o caminho, meu Deus?

A vida cobra, e você sabe como dizem que o relógio biológico é cruel para com as mulheres - que, ironicamente, vivem mais. Estar na cama no horário a semana toda para varar, de sol a sol, de sexta e sábado, noites de glória nos terraços da cidade: temos apenas dois dias na semana para nos tornarmos lendas do rock. We are young, so let's set the world on fire. Escrevi cantando. E, cantando em silêncio, com a voz da mente, escolho os brincos - e as companhias. É sábado à noite, e tem alguém me esperando. Às vezes, uma porção de gente. Às vezes, eu não ligo, ninguém liga e nada acontece - mas, enquanto eu tiver meu violão e meu diário, nunca estarei cem por cento só - ah, a bênção e a maldição de ter nascido artista! Pois, nesses momentos, até mesmo a minha própria presença é gente demais para uma pessoa só. E todo mundo sabe que abafar pensamento com fone de ouvido só dá certo na música da Regina Spektor. E que, para fugir de si mesmo, não basta cobrir o espelho e se mudar para Marte - ou será que pensamentos não ecoam no vácuo?

E, se alguém me perguntar qual é a minha maior paixão, responderei que é isto aqui: eu amo escrever, e, na maior parte do tempo, essa é uma das pouquíssimas certezas que tenho. Embora o tempo e sua voracidade implacável tentem me sugar a energia e as palavras. Embora os pensamentos cabunebulosos se emaranhem em uma palavrada difícil de desembaraçar. Embora o amor, as certezas e as coisas que, um dia, eu achava certas, mas sobre as quais me enganei feio, insistam em me escorrer pelas mãos. "A nossa hora vai chegar", eu disse e repeti à uma grande amiga, ontem e também três dias atrás. Mas, para mudar, não basta ter sonhos e boa vontade: então, o que fazer?

Enquanto quebro a cabeça (e a cara) tentando descobrir, sigo firme com minha única certeza e continuo escrevendo. E, quando eu descobrir, pode ter a certeza de que vou escrever, em detalhes, como foi que cheguei a essa conclusão. Eureca!

domingo, 3 de agosto de 2014

Intenso

Talvez ainda seja cedo para definir este como o ano mais intenso de toda a minha vida.


Você vive o quanto basta, mas já não é o suficiente. Você precisa estar em todos os acontecimentos, com todas as pessoas, em todos os lugares; tudo ao mesmo tempo. E, então, tudo muda. E você vê pessoas que ama partirem - e você, bem, você tem que ficar. Porque ainda não chegou a sua hora. E você descobre que algumas das pessoas que partiram precisam mesmo é ir com Deus, porque talvez não fossem quem você pensava que fossem. Mas paciência. A elas, tudo de bom. A você, mais sorte na próxima vez.

E, nessas noites quentes, voláteis e etílicas, você se perde entre pensamentos de verão e juventude: não vai durar muito. Porque nada dura muito quando se trata de verão e juventude. Quando eu era criança, meia hora parecia uma eternidade, e eu perguntava vinte vezes para a minha mãe quando é que a gente iria chegar. Se o bolo já estava pronto. Se eu já tinha idade o suficiente para usar batom vermelho.

Por isso, bebo a vida aos goles. Às vezes, bebo com tanta pressa e desespero, que me afogo. Mas, se me afogo, rio. É o rio da vida seguindo em fluxo solto, me fazendo cócegas demais. A ponto de fazer com que as noites de sono e tardes preguiçosas de domingo pareçam uma grande perda de tempo. Oito horas por dia, cinco dias por semana, sirvo ao mundo corporativo - mas o que fazer com as outras dezesseis horas e os outros dois dias?

Viver ao máximo é algo que a gente nunca aprende o suficiente - e, no final da vida, por mais intensa que ela tenha sido, talvez fique aquela sensação de que as noites poderiam ter sido ainda mais curtas; os dias, ainda mais longos; o sol e os sonhos, de janeiro a janeiro. Foi o que nos ensinou um grande hedonista e pensador, o rei Salomão: tudo é vaidade. Todos os meus batons e vestidos e noites em telhados, debaixo de mil e uma luas, são vaidade. E já estou atrasada. Vamos, então, morrendo de pressa, desperdiçar nossos dias não em camas ou em carros ou entre quatro paredes - vamos, que a noite é uma criança, e que o dia quer nascer feliz.

A gente nunca aprende a viver completamente. Mas viver é como dançar com um homem: se ele sabe conduzi-la, você não sabe como, nem de onde, nem por que, mas dança. E dança. E o tempo de uma noite é medido em quantas músicas vocês dançaram sem perceber, nem saber - mas dançaram. É assim que se vive (mas, disso, eu não tenho assim tanta certeza).

Porque viver de verdade é a maior das utopias. Mas são as utopias que nos movem de um lado a outro do salão. A música ainda não acabou. E, se acabar, logo outra começa. É só não parar de dançar.

domingo, 15 de junho de 2014

Uma semana, um dia, um mês.

Hair Color Forever! | via Tumblr
 
A gente sabe o que acontece quando uma semana dura um mês: algo está pra mudar. Ou já mudou. De novo. De vez. 
 
Ele foi embora, você bateu asas. Lágrimas de ambos os lados (talvez). O auge do desespero ao sentir aquele perfume em um estranho qualquer no metrô. Aquele perfume que ficava impregnado no seu cabelo enquanto você voltava pra casa. Mas não é o mesmo cheiro - é o mesmo perfume, mas não a mesma carne. E ele não voltou, nem te ligou. Você nem ligou. Quer dizer, ligou, sim. Mas você é jogo duro e finge que não. Não na frente dele. Não na frente das crianças. A gente tem que ser forte, que é pra todo mundo ver e aplaudir. "Mulher virtuosa, quem a achará?"; mas um néscio a deixou partir. Quando o sol já havia partido. Quando todos já haviam partido. Só restaram vocês, a sós. E um pouco de tensão. E saudade, e desejo, e dor. Mas nem ele ficou. Foi o último a sair, mas saiu. Fechou a porta. Calou a boca. Até mais. Nunca. 
 
A gente sabe o que acontece quando se dá conta de que aquilo tinha que acontecer. E de que aquilo iria acontecer de qualquer maneira, sem remédio, nem alternativa. Mas, por mais que a dor seja tão óbvia e tão presente, é tocando a rosa que se fura o dedo. Não que a gente não soubesse dos espinhos. É só vontade de sentir. Desejo, amor e dor. E dor. E dói. Mas, amanhã, passa. Um mês se passou nesses cinco dias. A lua trocou de cor umas três vezes. E você trocou a alma - e já está pronta para a próxima emoção.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Salted Caramel Snow



Em noite de Santa Ceia,
Serviram salada celeste:
E foi assim que um santo anjo
Derramou sal no céu,
Salpicando meia Terra
De um branco de arrepiar,
Que faz a gente pedir a Deus
Que sirvam logo a sobremesa:
Se a Terra virou sorvete,
Que venha calda de caramelo
Derreter logo esse gelo
Em meio a um doce verão
Sabor salted caramel mocha.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Sonhavararnoite


Eu tento dormir cedo,
Mas a noite não me deixa ir
Para onde vão todos
Os sonhadores,
Os pescadores,
Os lenhadores.
Senhoras!
Senhores!
Quais são os seus
nomes?
Quais os
medos
e  quais os
papos
que populam
o ledo lado de
lá?

Sei lá.
Só sei que,
Se a vontade apertar,
Se o desespero,
Se o desatino
se destinar,
A gente volta a sonhar,
a qualquer
hora,
em qualquer
lugar.
Em cima da
cama,
do
mundo,
do
muro.

São noites em claro:
Sonhar dá medo no do escuro.